Fiquei surpreendido com algo que li recentemente. Uma ideia que tinha sobre um problema num dos pilares da formação humana esvaziou-se com um rapidez tal que só pode ser comparada com a perca de confiança generalizada no sistema monetário e financeiro.
Porquê este post? Porque encontrei novamente um pensamento meu de direita que chocava com uma crença de esquerda. Preciso de ajuda para clarificar isto e conviver melhor com esta situação.
Todas as citações são provenientes do texto de Alfredo Margarido (As obrigações da esquerda) no livro compilado pela Juventude Socialista: O que é governar à esquerda?
Imaginava que uma das grandes falhas no sistema educativo era o esvaziamento da figura do professor enquanto peça fulcral no ensino, no transmitir conhecimento para as gerações vindouras. Esvaziamento sobretudo pela perca sistemática daquilo a que chamei referência, enfim no fundo que os educandos já não tinham no seu professor aquela identidade que era respeitada (não por via da autoridade, austeridade, mas pela via da sabedoria).
A figura do professor foi substituída paulatinamente por outras figuras não menos importantes, nomeadamente provenientes das suas famílias, ou mesmo, por outras referências externas, facilmente acessíveis através de vários estímulos como TV ou Internet. Mas mesmo assim o assunto é recorrente: “a degradação da família” evocando “a autoridade incontestada do pater-familias, obrigada a modificar-se sob pressão das novas regras sociais”. Assim o problema de perca de referências não está apenas no professor, mas incide também no conceito normal de família.
O que eu descurava, era que estava a ligar a educação a um sistema hierárquico, por via da tradição, forma esta, subtil, de “naturalizar as formas de dominação”. Parece que esta dualidade só funciona se a dominação estiver presente, reforçando-a, o que significa o fomento da desigualdade entre os homens (a tal crença de esquerda): “eis por isso o nó central do choque, já que a tradição se destina exclusivamente a conservar não só as práticas culturais, mas sobretudo as regras rígidas das hierarquias. O progresso não pode instalar-se senão à custa da modificação contínua, Às vezes brutal, das formas rígidas das hierarquias sociais.”
O meu pensamento significava portanto defender esta hierarquia, que seria de alguma forma defender a Tradição, situação que me levaria a outra contradição: “o tradicionalismo, aferro às tradições ou usos antigos. Qualidade de quem desafeiçoado às ideias de progresso… sendo o tradicionalista, pessoa partidária dos sistemas opostos às ideias de progresso…”. Contradição esta que seria a defesa de uma sociedade assente em valores opostos a uma sociedade que almeja o progresso… “reforçando a complexidade das hierarquias”.
Este Progresso tem duas componentes: o técnico e o moral. “Uma simples operação destinada a actualizar as técnicas” não conduz ao progresso no sentido de “reduzir as desigualdades entre os homens”… “o simples facto de se pensar o progresso apenas em termos técnicos salienta a o importância do peso da tradição, que considera justa e necessária a violência exercida sobre os trabalhadores para assegurar o crescimento tanto do parque técnico como dos rendimentos dos capitais investidos”, ou seja, a presença das formas dominadoras.
Numa altura em que se fala que o sistema educativo está cada vez mais permissivo, que se considera que os alunos são cada vez mais, irrequietos, irreverentes, irresponsáveis, não respeitam o próximo (colegas, funcionários e professores), que os próprios professores manifestam menos interesse pela actividade, ou que já vêm com clara deficiências na sua formação de base (comprovado com a necessidade de saber se o professor recém formado tem apetência ou não – sujeita a avaliação), no fundo, que o discente cada vez está menos preparado para ser um membro activo da sociedade, numa altura também a modernidade, enquanto sinónimo de progresso (técnico e moral!?) é o mote, que fazer então?
Não pretendo (nem acredito) que a banalização da educação e da cultura e a escola seja a resolução para todos os problemas da sociedade: “a escola não pode resolver os problemas sociais” onde se esperava que “a banalização da cultura pusesse em causa a rudeza abrupta da hierarquização social. O que se pretende dizer é que uma das tarefas importantes dos governos de esquerda reside na multiplicação dos meios escolares postos, desde muito cedo, à disposição das pessoas. Não para resolver a questão social, mas para contribuir para a resolução de diferenças. … o paradoxo que a esquerda tem a resolver é de enunciado simples: a escola não pode assegurar os mesmos resultados a todos, porque a sociedade a tal se opõe. A tarefa complexa da esquerda é agir no sentido de reduzir a violência do choque provocado pelas condições iniciais da desigualdade” - mais uma vez salientada o paradoxo entre o meu pensamento de direita e a crença de esquerda.
Fica claro portanto que o ensino deve ser universal no que respeita ao seu acesso… mas fica por resolver a pratica do ensino mais eloquente com este paradigma sem cair no erro de defender formas dominadoras, mas sim em preparar cidadãos capazes de superar, suprir as desigualdades inerentes à nossa sociedade.
Alguém me pode ajudar?
PS: também sei que tenho crenças sociais claramente de esquerda, mas que na prática, fui moldado e formatado para reagir e agir segundo os preceitos de direita. Não gosto de ter paradoxos na minha cabeça.
PS: espero que o próprio post não seja ele um paradoxo.
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